Cerca de 20 mil israelenses marcharam em Tel Aviv, no dia 15 de janeiro, para protestar contra a decisão do Knesset de investigar as organizações políticas de esquerda e as de defesa dos direitos humanos, em especial suas fontes de recursos. Representando uma ampla faixa do espectro político de centro e de esquerda de Israel, os manifestantes e oradores denunciaram a ação como similar à ‘caça às bruxas’ do macartismo dos anos 1950 nos Estados Unidos.
O protesto foi desencadeado pelo voto do Knesset no sentido de criar um comitê parlamentar de investigação dos grupos de esquerda, alegando que estão comprometidos com campanhas de “deslegitimação” contra o Estado de Israel e suas forças armadas. A investigação irá focar nos recursos financeiros desses grupos, supostamente para verificar se recebem dinheiro de fontes externas ou de organizações consideradas envolvidas em atividades terroristas. A medida foi iniciativa do partido de extrema-direita Yisrael Beiteinu, do ministro do Exterior Avigdor Lieberman.
Os manifestantes desfilaram sob a palavra de ordem “Ato público (enquanto for ainda possível) pela Democracia” e representavam um amplo arco de organizações inclusive o centrista Partido Kadima, o Paz Agora, a Associação pelos Direitos Civis, o partido social-democrata de esquerda Meretz, o Partido Comunista de Israel e uma série de entidades de direitos humanos. Os membros do parlamento que se opuseram à ‘caça às bruxas’ estavam entre os manifestantes e oradores.
Os manifestantes carregavam lemas em que se lia: “Perigo! Fim da Democracia à vista”; “Lutemos contra o Governo das Trevas”; “A Democracia Brada por Socorro” como reportou o jornal Haaretz.
O deputado do Kadima Meir Sheetrit disse que a decisão do Knesset é "ofensiva e perigosa para o Estado de Israel... e faz do país um dos Estados das trevas." Conclamou as organizações a rechaçar a investigação caso seja lançada.
O deputado do Meretz Nitzan Horowitz declarou: "Estamos aqui em oposição à radicalização religiosa, às leis racistas e à repugnante incitação contra os trabalhadores estrangeiros e contra aqueles que não são leais a Lieberman. E agora estão pondo as organizações de direitos humanos na alça de mira."
Horowitz disse que o primeiro ministro Benjamin Netanyahu partilha dessa vergonha uma vez que “está encorajando a celebração racista no Knesset." Criticou também o ministro da Defesa Ehud Barak, por ter aberto uma dissidência no Partido Trabalhista. “Você não está envergonhado, senhor Barak?" perguntou Horowitz. "Você e seu partido estão apoiando e possibilitando a existência do governo mais racista na história do Estado de Israel."
Hagai Elad, diretor executivo da Associação pelos Direitos Civis afirmou: “Os milhares de pessoas que aqui estão entendem que nossa democracia necessita de proteção contra aqueles que a querem destruir. Somos os porta-vozes de uma voz clara em defesa dos direitos humanos e da democracia e contra o racismo, o macartismo. Continuaremos a lutar pelos valores democráticos, liberdade de expressão, direitos iguais para os cidadãos e fim da ocupação."
A organização de Elad é uma das 16 entidades israelenses de direitos humanos bastante conhecidas que assinaram uma carta aberta protestando contra a medida do Knesset.
"Investiguem a nós todos. Não temos nada a esconder. Os senhores estão convidados a ler nossos relatórios e nossas publicações. Ficaremos felizes se responderem de modo direto os nossos questionamentos em vez de tentar atacar a nossa honra. Não funcionou no passado e não funcionará agora."
O deputado de direita Michael Ben Ari denunciou o ato de protesto, rotulando os citados grupos como “movimentos de extrema-esquerda que “gostariam de ver o Estado de Israel destruído” e que “estão traindo o Estado e, por conseguinte não há como não avançar novos passos contra eles. Iremos revelar que eles são financiados por Estados inimigos."
Até o presidente israelense Shimon Peres se opõe à investigação do Knesset, afirmando ao Haaretz que ela causa dano à democracia israelense.
Numa declaração publicada antes da marcha, Dov Khenin, dirigente do Partido Comunista, deputado e advogado de direito civis, advertiu quanto às lições do macartismo norte-americano.
"A criação de comissões parlamentares de investigação de atividades políticas está associado ao nome do senador republicano por Wisconsin, Joseph McCarthy, ativo nos dias mais sombrios da Guerra Fria" disse Khenin.
"McCarthy é tristemente célebre por sua iniciativa, apresentada num discurso de fevereiro de 1950, de investigar funcionários do governo de “colaboração com o inimigo. '
"O senator McCarthy foi indicado como presidente do Sub-comitê de Investigação. O Comitê Parlamentar de Atividades Anti-americanas trabalhou em paralelo. Os dois comitês publicaram uma lista de organizações hostis a serem investigadas. Entre elas constava o Sindicato Nacional de Advogados, acusado de antiamericanismo por incluir advogados negros em suas fileiras.
"Uma vez que é muito difícil estabelecer limites às investigações políticas, o comitê estendeu suas atividades das organizações para pessoas da indústria cinematográfica e de entretenimento. Pessoas como Charlie Chaplin, Berthold Brecht, Leonard Bernstein, Aaron Copland, Arthur Miller, Orson Welles, Paul Robeson e Pete Seeger, e muitos mais, foram investigados ou obrigados a depor.
"A ‘caça às bruxas’ contra os progressistas tomou conta do Congresso durante três anos, causando grande miséria humana e dano social. A sociedade norte-americana tratou de superar o trauma e seu pesado preço histórico e social. Temos de aprender dessa experiência. Não podemos trilhar esse caminho e criar uma comissão parlamentar de investigação política."
"O macartismo tem por objetivo a intimidação de pessoas envolvidas em ações legais no exercício de seus direitos democráticos", disse Khenin. "É isso o que o Likud e o Yisrael Beitenu estão propondo: uma injeção letal na democracia."
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