terça-feira, 30 de novembro de 2010

A mistificação da democracia: a ideologia nos meios de comunicação

Por Antonio Alves

RESUMO

     A comunicação social tem um papel fundamental na nossa sociedade. A sua ação, como conjunto de proposta de neutralidade nos diversos meios de comunicação começou a se servir de uma proposta democrática que não condiz com a realidade, sendo um ambiente de disputa ideológica com características de mercado, onde, mesmo com o desenvolvimento de vários veículos de comunicação, essa democracia ainda não existe de maneira objetiva, pois fundamentalmente atende a interesses financeiros de grandes corporações, seja do setor da informação ou não.

Palavras-chaves:Comunicação. Democracia. Poder.

Introdução

     A comunicação social sempre teve papel relevante em todas as sociedades, depois de séculos de desenvolvimento, levando em consideração os avanços tecnológicos, com todos os seus nuances instrumentais, como o desenvolvimento da fala, a escrita, a criação da imprensa, o jornal, o rádio, a televi-são, o cinema e a internet. Sempre alimentando um mito, o qual, com o livre acesso a diversos veículos de comunicação, vivenciaríamos uma situação plena de democracia. O que se percebe é que mesmo com o advento da internet, a democratização dos meios de comunicação ainda é uma falácia, pois, com o avanço das políticas neoliberais, se percebe a atuação hegemônica de um pensamento único, que mercantiliza a comunicação, e traz a tona uma face perversa, onde as noticias são criadas para dar uma fundamentação aos fatos, e não os fatos são fundamentações para a criação das noticias.

     Neste artigo, apresentamos um problema da nossa sociedade contemporâneo. A mercantilização dos meios de comunicação como parte fundamental da manutenção da ideológica do Capital, com a mistificação da democracia e liberdade, com a perversidade da criminalização de outros atores que se contrapõe ao modelo vigente, com os seus diversos artifícios para subsumir a realidade e aparentar se ter um espaço democrático de comunicação.

1 - Há democratização na comunicação?

     A possibilidade de maior participação e interação pelas novas formas e meios de comunicação, criou uma sensação de democracia aparente, mais que na sua prática consubstancial, não condiz com a realidade. Pois as grandes corporações detêm o monopólio das informações, e mesmo com apontamentos de que há avanços, a proporção de pessoas com acesso é muito pequena a mais diversas formas de comunicação moderna, como bem coloca Ramonet (2007), há menos linhas telefônicas na África negra que na cidade de Tóquio... o número de computadores pessoais mal ultrapassa os 200 milhões para uma população de 6 bilhões de pessoas. Sendo assim, percebemos que a uma limitação a essa aparência de democracia, o que fica evidenciado com as formas e utilizações das novas tecnologias.

     Não podemos esquecer o papel das agências de noticias, que padronizam e hegemonizam as informações que circulam no mundo, utilizando seus critérios para a circulação de informações, colocando algumas noticias como fatos acabados e atendendo a certos interesses, que quase sempre estão ligados a setores fortes da economia.

     Um exemplo evidente é a forma de atuação ou omissão dos meios de comunicação. No período histórico do pós-II guerra mundial, o que ficou conhecida como Guerra Fria, todos os dias acontecia o que podemos dizer, um ataque midiático ao muro de Berlim, que dividia a Alemanha Socialista (República Democrática Alemã – Alemanha Oriental) da Alemanha Capitalista (República Federal Alemã – Alemanha Ocidental), com os adjetivos mais provocativos, como o “muro da vergonha”, “a cortina de ferro”,”o muro da infâmia”. Hoje, mais de 20 anos após a queda do muro, outros muros surgiram e seguem invisíveis, ou com pouca comoção midiática, como o muro que o Estado de Israel fez para separar e oprimir o povo palestino, o muro de Marrocos ou o que os EUA fez para impedir a entrada de mexicanos em seu território(GALEANO,2008).

    Esses são exemplos de que a benevolência democrática é só uma desculpa para a atuação do Capital, pois o que o muro de Berlim separava não era a nação, mais sim o modelo econômico.

    As construções da abordagem também apontam seus limites, pois, sempre se percebe certa nuance dos fatos que compõe as noticias nos grandes veículos. Geralmente os temas políticos são dimensionados com seus víeis intrínsecos, principalmente com relação a política econômica e internacional.

    Em uma simples troca de enquadramento de um ancora televisivo, percebemos a mudança no tom de voz e feição do apresentador quando fala de algum assunto polêmico, por exemplo: o cancelamento da concessão pública de televisão a RCTV na Venezuela pelo Presidente Hugo Chaves, ou a Libertação de presos políticos pelas FARC-EP, ou a tentativa de golpe de Estado no Equador.

    Mais não percebemos um ar de reprovação ao anuncio de mais uma privatização, a abertura de um novo mercado econômico que abalará a estrutura econômica brasileira, ou até na constatação de fatos que são científicos e revelam a ação discriminatória do poder vigente, como o caso da pesquisa que revelou que a agricultura familiar produz mais alimentos para a população brasileira que o agronegócio.

    A democracia se transformou em uma criatura mitológica, ao qual, acreditamos existir por si mesma, como uma palavra mágica, mais sem entendermos a sua forma e concepção. O mito da democratização dos meios de comunicação se dá pelo fato de ser uma democracia de mercado, pois, como a própria historia do rádio aponta em seu início, é um clube seleto que desfruta de suas vantagens, porém, antes esse clube era só para desfrutar do privilegio de se comunicar e obter a informação, e hoje, ele é o clube dos que produzem a comunicação em escala mundial.

    O que se classifica como democracia da informação se revela no que Ramonet(2007) aponta como a possibilidade de sermos divididos entre os info-ricos e os info-pobres.


2 – A invisibilidade midiática

    A prática de invisibilidade é comum nos meios de comunicação. Com o expediente que tenta negar a realidade objetiva, e retirar da pauta os grandes temas de mobilização social, como os conflitos gerados por uma demanda de problemas sociais que não foram solucionados historicamente na sociedade em geral e principalmente na brasileira.

    Fatos históricos são conhecidos por boa parte das pessoas que ultrapassam o senso comum, pois sabem que os meios de comunicação exercem um papel fundamental na política de controle social, como arma fundamental na construção da hegemonia do pensamento, e as estratégias adotadas são as mais variadas. Como Betinho(1984) expressa que os órgãos de inteligência trabalham com um sentido de “guerra” na produção de informação e contra-informação, onde o que interessa é o objetivo que o órgão persegue e não o fato.

    Com esse monopólio dos principais meios de comunicação de massa, passamos a perceber uma nova forma de poder político que emerge do crescente desenvolvimento dos meios de comunicação, tendo o poder, quase que ilimitado de construir o real, de definir o real, de incluir ou excluir atores, forças e movimentos do quadro real apresentado a milhares de pessoas (BETINHO, 1984).

    Exemplo mais discutido nos meios intelectuais no ano de 1990 foi à forma que foi editado o debate entre os candidatos a Presidência da República em 1989, protagonizado por Collor e Lula, onde a edição de imagens e declarações colocou o “melhor de Collor” e o “pior de Lula”(LAGE,1998).

    São fatos como esse que demonstram o poder que a mídia tem e como agem caso alguma ação aponte na perspectiva de superação ou que vá de encontro com seus interesses. A comunicação se tornou um mercado lucrativo e de poder político tão expressivo que até construiu um lobby nas diversas casas legislativas no mundo

    As várias estratégias utilizadas para criminalizar atores e movimentos sociais são realizadas quase de maneira imperceptível, mais que cumprem esse papel de forma exemplar, com adjetivos que mudam na forma, mas não no conteúdo, as organizações populares, movimentos sociais tendem a serem criminalizadas ou discriminadas de forma ferrenha nos diversos meios de comunicação, com a acunha de “terroristas”, “subversivos”, “desordeiros”, “bandidos”, “arruaceiros” e “marginais”. Demonstrando que não é uma prá-tica recente, pois, historicamente no Brasil e no mundo se aponta casos como o relato da Guerra de Canudos, demonstrado em “Os sertões” de Euclides da Cunha (ARBEX,2003).

    O mesmo autor aponta as estratégias utilizadas para o processo de satanização dos movimentos sociais, colocando em evidencia essa forma de atuação com 5 pontos, ao qual em seu livro demonstra como foi utilizada contra o MST (Movimento dos Trabalhadores rurais Sem-terra). A invisibilidade (que consiste em ignorar o grupo social citado), a divisão (dando mais espaço para uma liderança do movimento em detrimento de outra, mexendo com a vaidade de certos representantes), a desqualificação (colocando sempre a força da autoridade de um especialista no assunto, desqualificando o movi-mento. Ex: Na opinião do MST. Segundo o economista da USP), a coopta-ção (tentativa de fazer com que lideranças abandonem os objetivos do mo-vimento, para desarticular aquele grupo social) e por último a demonização (onde vale tudo, calúnia, difamação, mentiras).

    Com essas contradições evidentes, percebemos que se houvesse uma verdadeira democracia nos meios de comunicação, alguns fatos nunca seriam omitidos ou ignorados, e grande parte dos problemas que fazem parte da pauta dos movimentos sociais seriam mais bem compreendidos pela população dotada de um senso comum.

3 – Comunicação e comércio

    O mundo com seu novo paradigma comunicativo entra em uma nova vertente, onde a democracia não é praticada, mais comprada, ou melhor, dizendo comercializada.

    Vivemos um momento de perversidade sutil, pois, a esfera econômica dominou a política, além de dominar a comunicação. Milton Santos (2005,40) destaca que

    Há uma relação carnal entre o mundo da produção da noticia e o mundo da produção das coisas e das normas. A publicidade tem, hoje, uma penetração muito grande em todas as atividades. Antes, havia uma incompatibilidade ética entre anunciar e exercer certas atividades, como na profissão médica, ou na educação. Hoje, propaga-se tudo, e a própria política é, em grande parte, subordinada às suas regras.

    Com essa subordinação do público pelo privado e a ideologia de mercado cada vez mais forte, percebemos o quanto é complexa a situação de nossa sociedade, onde a hegemonia do Capital se fortaleceu e acabamos entendendo a frase clássica de Marx (1845-46) as idéias dominantes, são as idéias das classes dominantes.

Conclusão

    Com essa constatação, não temos dúvidas do que está em processo, não como avanço ou desenvolvimento, mais como forma de homogeneização do pensamento, das formas de entendimento com relação às diversas realidades, tornando cada vez mais vulnerável a sociedade que crê como mistificação na idéia de neutralidade e democracia dos meios de comunicação como solução em si mesmo dos problemas sociais e da ideologia dominante.

Referências

ARBEX Jr,José. O jornalismo canalha.São Paulo-SP: Editora Casa Amare-la, 2003.

SOUZA, Herbet José de. Como fazer análise de conjuntura. Petropolis,RJ- Editora Vozes, 2009.

GALEANO,Eduardo. Espelhos: uma historia quase universal. Porto Alegre,RS: Editora LP&M 2008.

LAGE,Nilson. Teoria e técnica do texto jornalístico.Rio de Janeiro-RJ, Edi-tora Elsevier, 2005.

RAMONET, Ignacio. A tirania da comunicação. Rio de Janeiro-RJ, Editora Vozes, 2007.

MARX,Karl. A ideologia alemã. São Paulo-SP, Editora Martin Claret, 2009.

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único a consciência universal. Rio de Janeiro-RJ, Editoral Record, 2000.

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